Uma promessa de futuro

por Fábio Ramalho

O boom se tornou assunto recorrente. Sempre que alguém o enuncia, multiplica também os seus efeitos, pois ele é determinado não apenas pela concretude dos dados materiais, mas também – e talvez sobretudo – pela propagação do sentimento que celebra. Ele se realiza como antecipação: só existe quando acreditamos que o futuro se fez presente e, sendo assim, é indissociável da noção de progresso. Sua força é centrífuga, sua imagem é a de uma curva ascendente e seu movimento característico é o de expansão.

Uma vez proclamado, o boom pretende converter o futuro próximo em presente – atestando, portanto, uma aceleração – e apresentar o horizonte intangível como uma aspiração que se pretende factual. Sua força deriva da sugestão de longevidade. Paradoxalmente, ele é tanto a expressão de um contexto imediato quanto o indicador de uma tendência que não sobrevive se não é capaz de assegurar uma duração. Sendo assim, o olhar em perspectiva seria a única arma capaz de colocá-lo à prova. A distância temporal, por sua vez, é o lastro que o ratifica ou a força que o desmente.

O boom, portanto, coloca em circulação uma promessa de futuro – é aposta e especulação. Nos tempos que correm, é quase sempre apresentado sob a forma de uma explosão de consumo que é tão promissora quanto alarmante. Isso porque o anúncio do boom nos convida a comparar conquistas, mensurar ganhos e formular novas demandas, e se resulta em grande medida insustentável é porque leva à formulação de anseios mais ambiciosos que, dentro dessa lógica, não deixam de ser legítimos. Se sua razão, aliás, mostra-se em grande medida perversa é porque reverte algumas necessidades de formação – o acesso à educação, às viagens, à tecnologia, aos artefatos culturais – em objetivos que seriam alcançados pelo viés do tão incensado crescimento econômico, criando desse modo padrões de vida e expectativas que não estão asseguradas ou mesmo previstas pelo marco dos processos que o instauram.

Para seus defensores mais exacerbados, o boom eventualmente suscita delírios de grandeza que não suplantam nem redimem o complexo de inferioridade mas, pelo contrário, são a contrapartida mais óbvia deste último. Quando centrada no poder de compra e no aumento da produção, essa fábula de ascensão é necessariamente predatória. É por isso que ao ouvir falar do boom é impossível não questionar o que viria depois dele. Não porque duvide da conjuntura que ele busca exprimir – seus efeitos são, infelizmente, bastante perceptíveis –, mas porque não posso deixar de me perguntar como seria possível cumprir as promessas que ele assinala, responder às crenças que o alimentam. A essa altura, temos todos os motivos para suspeitar que essa aposta constitui, na verdade, um blefe.

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